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Há 11 anos me tornei pessoa com deficiência, após uma cirurgia delicada para retirar um cisto na medula, descoberto após exames feitos para investigar dores nas costas, câimbras, dormências e paresias nas pernas. A cirurgia foi bem-sucedida, me deixou com uma sequela no lado esquerdo, da cintura para baixo, tive perda motora e sensitiva. Após 5 meses em cadeira de rodas e muita fisioterapia, reaprendi a andar e pude voltar ao trabalho, sempre com o auxílio de uma bengala. Depois foram longos cinco anos de fisioterapia e reabilitação.
Na ocasião, eu trabalhava em uma grande empresa e não via a hora de retornar, só havia ficado afastada muito tempo durante minhas duas licenças maternidade. Minha vida mudou! Tive que me adaptar ao meu novo jeito de ser, de andar e entender que as minhas limitações físicas existiam, mas não mudaram minhas habilidades profissionais. Entendi que eu continuava sendo protagonista, mesmo tendo que conviver com olhares de amigos e colegas de trabalho, que duvidavam da minha capacidade.
Após um ano e meio fui demitida junto com várias outras pessoas. Aqueles cortes em massa que quem já trabalhou em comunicação, sabe bem como é. Mas antes disso, assim que voltei ao trabalho, fiz uma coisa que na ocasião não entendia, mas achava necessário. Levei meu laudo médico ao RH e disse à diretora, que a partir daquele dia, podiam me inserir na “lei de cotas”. Na minha cabeça eu achava que isso ia trazer benefícios para a empresa, já que só via colaboradores com deficiência em cargos administrativos ou menores que o meu e imaginava que tinham dificuldades para encontrá-los.
Na sequência, em minhas buscas por uma nova oportunidade, coloquei no currículo que era “pcd” e para minha surpresa choveram vagas. Isso mesmo, vagas em áreas que não tinham nada a ver com minha profissão ou minha área. Ficava claro que os recrutadores nem se davam ao cuidado de ler meu currículo, de ver minhas habilidades, estavam apenas interessados em “preencher a cota”.
Desconhecimento ainda é o maior desafio
Existe um desconhecimento em relação à legislação, tanto da Lei de Cotas, quanto da LBI. Tanto dos empregadores, quanto dos profissionais que ainda desconhecem seus direitos e deveres.
No tocante às questões de trabalho e renda, a conhecida Lei de Cotas, Lei Federal n° 8213/1991, é afirmativa ao determinar que empresas com 100 funcionários ou mais tenham de 2% a 5% de seus cargos preenchidos por pessoas com deficiência. É o que prevê o artigo 93 da Lei, que apesar de seus 31 anos, ainda não é plenamente cumprida. Em se tratando de mercado de trabalho, as pessoas com deficiência ainda enfrentam muitos desafios.
As empresas que não cumprem a Lei de Cotas apontam motivos e desculpas das mais diversas, sendo a mais frequente a falta de capacitação dos candidatos com deficiência. Outros fatores são a ausência de fiscalização dos órgãos competentes e a resistência dos empregadores em promover as condições necessárias para profissionais com eventuais limitações físicas, intelectuais ou sensoriais.
Por outro lado, profissionais com deficiência se dizem qualificados, mas sem oportunidades e culpam as empresas pelo baixo percentual de cumprimento da Lei de Cotas. Na verdade, ambos os lados têm razão em suas críticas, o que não subestima a necessidade de capacitação continuada exigida nos dias de hoje para todos os profissionais.
Em pesquisa realizada e divulgada este ano pela Talento Incluir, empresas que foram questionadas onde estão as maiores barreiras para criarem políticas e ações inclusivas para pessoas com deficiência, 44% afirmaram que é pela falta de preparo da equipe de RH, 41,67% disseram que é pela baixa qualificação dos talentos e 78,4% falta de preparo dos líderes para gerir profissionais com deficiência.
Isso prova o quanto estamos longe de termos empresas realmente inclusivas. Há falta de informação e conhecimento. Para se criar uma cultura organizacional atrelada à responsabilidade corporativa que zela em cumprir boas práticas é preciso muito mais do que apenas contratar pessoas com deficiência para cumprir a Lei de Cotas.
Direitos garantidos
Apesar da importância da Lei de Cotas e da luta para garantir os direitos das pessoas com deficiência, ainda existem desafios para que a inclusão aconteça em todos os contextos no mundo do trabalho.
Em matéria divulgada semana passada, desde janeiro deste ano, os profissionais com deficiência foram mais demitidos do que contratados, no Estado de São Paulo, conforme – “Base de dados da pessoa com deficiência”.
Empresas que de fato valorizam a DE&I, são as que prezam por transformações que impactam a vida de todos, inclusive o crescimento de um ambiente saudável e produtivo, ao sensibilizar gestores e preparar equipes para receber profissionais com deficiência. Também investem em acessibilidade, em tecnologias e em espaços para que esses profissionais possam atuar em condições de igualdade em relação a seus colegas de trabalho sem deficiência.
Esse é o propósito da Talento Incluir! Promover a inclusão de profissionais com deficiência, capacitar e levar informação para empresas que trabalham com esses valores que, aliás, estão em conformidade com a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) – Art. 34. “A pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em ambiente acessível e inclusivo, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas”.
Por Ciça Cordeiro, consultora na Talento Incluir